sábado, abril 30, 2011

De Zé Godoi a Gandhi: cábalas e crenças que escrevem a história nerancieri

No último dia 17, domingo, às 12 horas, a Tropical Academia recebeu os jogos de fundo da 4ª rodada do Csapão Apertura 2011. Pelo Grupo A, encontraram-se, finalmente, o XI com Álcool e o Black Jack, depois da previsão de disputa na abertura da temporada e que, por uma mudança de última hora na tabela de jogos, teve de ser adiada para nova data.

Mas a história do duelo começou antes da chegada aos limites do reduto localizada no Bairro Minas Brasil. Iniciou-se, claramente, nas trajetórias dos atores daquela tarde vindos de suas residências para seu compromisso. Nesse ínterim, sinais no caminho foram ajudando a explicar por que um novo enredo tem sido desenvolvido na história ‘orange-noir’.

As sobrenaturais narrativas sempre contam com um relógio, símbolo de que algo está por vir nos próximos minutos ou horas. Os ponteiros que cruzaram a vida dos veteranos foram o do tradicional edifício do Zurich Minas Brasil, localizado na Praça Rio Branco, em frente ao Terminal Rodoviário Governador Israel Pinheiro, na capital mineira. Quando se deslocavam rumo à partida de pouco depois, Leonardo e Thiago Cançado se depararam com a marcação de 11 horas e 11 minutos e logo se despertaram para o fato.

Não poderia ser uma simples coincidência, não mesmo. E eis que, ao continuar a percorrer o viaduto que os leva ao centro da cidade, deparam-se à frente deles com um modelo do s mais antigos do Chevette com a inscrição ‘Zé Godoi: Fei que dói’. Godoi? Mas esse não era o nome do ex-árbitro de futebol que acabava de se recuperar das lesões sofridas em sua reação a um assalto sofrido na capital paulista? Embora não soubessem explicar o significado daqueles traços no céu ou no chão, ambos sabiam que tinha muito a ver com o que aconteceria a poucos quilômetros dali.

No prélio vespertino, o primeiro de que os ‘nerancieri’ participariam no ano, estava em jogo a possível classificação antecipada dos veteranos e a possível eliminação prévia dos calouros. Mas como ambas as situações dependiam do resultado do outro confronto disputado simultaneamente entre Esquadrilha Abutre e IPM, as atenções teriam que ser concentradas dentro de suas quatro linhas.

Para a partida, o XI com Álcool não contaria com Victor Hugo, autor de uma ótima estreia na 2ª rodada do torneio, que havia informado de antemão a respeito de sua ausência, nem Ramsés, que não iniciara sua participação até aquele momento no campeonato e ficaria fora mais uma vez em razão do aniversário de 88 anos da avó de sua namorada, um momento histórico. Além dos dois, a equipe também não contaria com os temporariamente aposentados Édson Silveira, com lesão no joelho, Mário Neto e Vinícius Lott, ambos sem condições físicas de disputar uma partida de alto impacto como as do Csapão.

Com isso, os multicampeões levariam à quadra a base que vinha atuando bem desde o começo do Apertura, contando, inclusive, com a volta do próprio Thiago Cançado, recuperado das cólicas renais que o deixaram um cotejo ausente. Presentes estavam o arqueiro Felipão, o fixo Adriano, os alas Diego e Thiago, e o pivô Carlão. Para o permanente rodízio, o fixo/ala Persa, o ala Bruno Alencar e o pivô Leonardo.

Do outro lado, os adversários do Black Jack vinham com sua força máxima, comandados por Thiaguinho e Bruninho, destaques em inúmeras competições anteriores, mas que, em 2011, não conseguiam impedir um movimento de queda livre e acelerada da equipe. Além deles, entraram para o jogo Cajango e André Reggiani para dar o suporte defensivo necessário.

As esquadras deram os pontapés iniciais na número cinco e, desde o primeiro minuto, o domínio dos onzimoalcoolianos foi evidente e a troca de passes entre Diego e Thiago, o RC do Csap, pode ser constatada desde já. Tão rápido o entrosamento do quinteto inicial que a primeira chance de gol surgiu na primeira descida da equipe. Em jogada construída na lateral esquerda do campo defensivo, a bola chegou em Carlão, centralizado na meia-cancha, e, exercendo bem o papel do pivô, ele logo abriu para Thiago receber na intermediária ofensiva. O ala recebeu-a e, sem pestanejar, não deu mais do que dois toques na bola antes de finalizar cruzado de direita no canto destro do arqueiro rival. De tão célere a jogada e por não estar com lentes, o setelagoano nem percebeu que ela havia balançado as redes e imaginou que houvesse desperdiçado a oportunidade. 1 a 0.

O reinício de jogo mostrou que a equipe do famoso jogo de azar, popularizado nos cassinos cinematográficos de Las Vegas e nas rodas de bar brasileiras, não se deixaria assustar pelo inesperado ímpeto ofensivo adversário. Por isso, não foram poucas as investidas para tentar alcançar o empate o mais rápido possível, o que não era obtido devido à marcação bem próxima dos ‘orange-noir’. A saída de bola veterana era impressionante e contava também com a presença constante de Adriano avançando verticalmente, como o madridista Kaká.

Mas se a principal fraqueza de uma esquadra está em sua principal virtude, isso pode ser comprovado com uma saída de bola do ala Diego que, ao perder uma bola na entrada da área, provocou sério perigo. Risco real, no entanto, ainda continuaria a atormentar o sistema defensivo da equipe e ocorreu após um lance que gerou faíscas em quadra. Após dividida no entorno do círculo central, Carlão e Thiaguinho se estranharam na linha lateral e o Gigante chutou uma bola que acertou o adversário caído ao lado da quadra. Naquele momento, o árbitro havia paralisado e assinalado falta que, contudo, não havia sido ouvida pelo pivô do XI. A rusga durou pouco e não gerou maiores conseqüências naquele momento, a não ser a clara chance de gol para o Black Jack.

Mesmo de longa distância, o lance inspirava cuidados para a defesa veterana. O chute desferido proporcionou rebote do arqueiro Felipão para frente, na pequena área, e Bruninho não desperdiçou a chance de empatar a partida. 1 a 1. A falha do experiente arqueiro seria discutida e apontada por muitos em razão de sua falta de ritmo de jogo, uma vez que havia atuado apenas na estreia e encontrava-se parado por muito tempo.

Depois da igualdade no marcador, o equilíbrio tomou conta da partida durante um tempo razoável e chances foram criadas por ambos os lados para o desempate. Apesar disso, a consistência que o XI imprimia desde a rodada inicial, quando começou a demonstrar uma mudança em seu estilo de jogo, ao passar a dominar a bola na maior parte do tempo, representou um diferencial.

Por isso, a troca incessante de passes colocava em permanente ação o pivô Carlão que, no começo da partida colaborou bastante ao voltar para auxiliar na marcação, atuando durante alguns momentos mais recuado do que os alas. Mas sua função principal continuava a ser a de homem de articulação e resolução no ataque e, sabendo disso, seus companheiros não hesitavam em lhe dar assistências. E em bola lançada do meio-campo, o Gigante recebeu dentro da área e tocou, marcado, por baixo das pernas do arqueiro adversário para fazer 2 a 1.

A partir de então, a equipe promoveu substituições constantemente e retomou o comando do jogo sem restrições. De forma alternada, entraram Persa, Bruno Alencar e Leonardo. O primeiro apresentou uma consistência defensiva que vem auxiliando a equipe a reequilibrar seu sistema defensivo, alvo de preocupações pelos onze gols sofridos em dois jogos. O segundo tem apresentado um vigor físico superior ao de quaisquer temporadas disputadas até então e adaptado à ala tem sido um substituição eficaz. O último vem resgatando a crença de que é possível manter a forma com o passar dos anos e derrubando mitos de que a tendência da equipe é de sofrer contra equipes mais jovens devido à condição atlética deles.

Com esse espírito, os ‘orange-noir’ seguiram a primeira etapa imprimindo um ritmo ao estilo arrastão, em que não havia nem tempo para sua vítima reagir ou perceber o que estava acontecendo. Os contra-ataques eram uma importante arma, mas as jogadas de bola parada não foram desprezadas. Em cobrança de escanteio, Carlão recebeu na entrada da área e a bola foi travada pela defesa oponente, mas o rebote sobrou para Leonardo na intermediária de ataque finalizar sem nem dominar no canto esquerdo do goleiro do Black Jack. 3 a 1.

O furor, no entanto, não parou por aí e, por isso, as faltas sofridas por Thiago Diniz foram acumulando, haja vista que não havia outra forma de deter suas investidas. Assim, por pelo menos três vezes ele foi derrubado quanto rumava para desequilibrar os rivais. Mas o quarto tento não veio aproveitando as infrações dos atletas do XXI Csap, mas, agora sim, explorando as roubadas de bola e partindo rumo à outra meta. Assim, Leonardo foi lançado no meio-campo, avançou verticalmente e cortou para a direita. Como o defensor não conseguiu nem esboçar reação, ele disparou no canto direito e, ainda que o arqueiro tenha conseguido tocar na bola, não conseguiu impedir que ela o superasse mais uma vez. 4 a 1.

Há muito o XI com Álcool não dominava tão amplamente uma partida como o fazia nessa tarde e por um período mais longo que de costume, o que demonstrava a solidez da equipe. Inspirados em tantos exemplos recentes do fut mundial, mesmos os desfechos impiedosos de Messi-Villa e vice-versa, os ‘nerancieri’ continuaram a armar o bote em sua defesa para arrematar em poucos segundos. A estocada seguinte foi tão ágil que soltou Bruno Alencar e Leonardo no campo de ataque e o primeiro aproveitou a chance para, de fora da área, tocar no canto do guarda-redes blackjackiano e fechar o placar do primeiro tempo. 5 a 1.

Com a partida em suas mãos (e em seus pés), a busca no intervalo foi por manter o foco para o reinício para que a vantagem obtida até então não fosse diminuída e, se possível, ampliada. Como a classificação para a fase seguinte dependia de outros resultados nessa rodada e na seguinte, não poderiam desperdiçar chances quando elas mais apareciam para retomar o caminho que levou a equipe à condição de mito no Csap.

Na segunda metade, os espectadores presentes, maior número nos últimos tempos, especialmente pela presença dos atecubanenses que haviam sido derrotados por 22 a 2 pelos XXiitas na partida que antecedera os onzimoalcoolianos, continuaram a observar mais do mesmo, novamente com a equipe que havia iniciado o primeiro tempo. A equipe que liderava a contagem não arrefeceu os ânimos e voltar a atuar de forma mágica como na estreia contra os Abutres, com constante posse de bola e girando a bola de um lado a outro, além de dribles desconcertantes. Um deles, inclusive, levou Bruno Alencar a cunhar a, agora célebre, expressão “Menino-Samba”, após uma tentativa de drible de Thiago Cançado na linha de fundo. O ala superou o goleiro adversário e somente não entrou com bola e tudo, não por humildade, mas porque foi interceptado por um defensor na bacia das almas.

Mas, nos lances seguintes, ninguém pode impedir o “Rolo Compressor” de continuar seus serviços. Em jogada que começou pela direito do ataque, Diego cortou a bola para o meio da área e soltou a pancada de perna esquerda no canto esquerdo da meta rival e confirmou o 6 a 1.

Como uma equipe de ponta, a equipe continuou trabalhando a pelota para minimizar os riscos e maximizar as oportunidades, aplicando um pouco do método SWOT, tão difundido nas aulas da Administração Pública. E encerando o campo ofensivo, não demoraria a surgir oportunidades para as finalizações e, assim aconteceu quando, mais uma vez, Diego recebeu, agora na esquerda, e só escorou com a ‘sinistra’ para ampliar em um toque cruzado o marcador. 7 a 1.

Com a clara desvantagem no marcador, o Black Jack repetia o artifício empregado nos primeiros vinte minutos e distribuía faltas a torto e a direito. Na etapa derradeira, a vítima passou a ser Leonardo, que se deslocava com a mesma velocidade que Thiago Cançado na etapa preliminar. Não faltou nenhum subterfúgio a ele, derrubado com tostões e agarrões.

Para suportar e superar a irritante e, invariavelmente, truculenta marcação, a solução foi seguir a ideologia abraçada pelo RC do Csap. Depois de cursar o mestrado, o baixinho adotou as leituras de Mohandas (Mahatma) Karamchand Gandhi, como uma ideologia a guiar seu caminhar. O princípio da resistência não violenta, como forma de protestar ao domínio britânico à Índia, pode ser visto na Tropical, afinal, o futebol arte não poderia se render à irrequietação para que ele não pudesse se visto por aquelas bandas.

Com tamanha vantagem, em alguns momentos é inevitável que ocorram alguns deslizes e, em um deles, o Black Jack aproveitou contra-ataque com André Reggiani e finalizou no canto direito de Felipão. A falha da recomposição defensiva foi observada com nitidez pelos presentes, uma vez que subiram dois avantes dos calouros contra três defensores veteranos desorganizadamente postados. Uns do lado esquerdo, todos os demais na outra porção da quadra. 7 a 2.

Mas além de não terem cometido mais do que cinco faltas para sofrerem tiros diretos, o Black Jack mais uma vez não foi alvo de disparos eficazes de seus algozes a partir dessa alternativa. O caminho foi, novamente, a cobrança de tiro esquinado e, reiteradamente, pelo lado esquerdo. Nessa oportunidade, a bola atravessou toda a extensão da área e sobrou para Leonardo que, posicionado no rumo da segunda trave, fora da área, repetiu o disparo de primeira do primeiro tempo e ao acertar o canto direito das redes do XXI anotou seu terceiro tento na partida. 8 a 2.

O XI ainda criou muitas chances no fim do jogo, mas pecou pela falta de capricho e paciência para dar um toque a mais e finalizar em melhores condições para ampliar o marcador. Assim o placar terminar mesmo como estava e, com o empate em 1 a 1 no outro jogo da chave, credenciou a equipe a terminar no segundo posto do Grupo. Para isso, será necessária a vitória por qualquer placar sobre o XXVIduzir neste domingo, 1° de maio, às 10 horas, na Tropical Academia. O primeiro lugar, no entanto, está confirmado para a Esquadrilha Abutre, uma Fênix da Escola de Governo Professor Paulo Neves de Carvalho da Fundação João Pinheiro.

E a classificação ratificou apenas que as superstições e as crenças são, também, meios que colaboram para o alcance dos objetivos traçados no início do planejamento. E, por sinal, será que os sinais no céu ligam, de alguma forma, Zé Godoi a Gandhi? De onde será que eles se conhecem?

Formações:

XI com Álcool: Felipão, Adriano, Diego, Thiago Cançado e Carlão. Entraram: Persa, Bruno Alencar e Leonardo.
Black Jack: Arqueiro, Cajango, André Reggiani, Bruninho e Thiaguinho. Entraram: Reserva 1 e Reserva 2.

Gols:

XI com Álcool: Thiago Cançado, Carlão, Leonardo (3), Bruno Alencar, Diego (2)
Black Jack: Bruninho e André Reggiani.

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